domingo, 19 de abril de 2015

História das Agriculturas no Mundo, de Mazoyer e Roudart

Técnicas e crises alimentando o mundo

MAZOYER, Marcel, e ROUDART, Laurence. História das Agriculturas no Mundo: do neolítico à crise contemporânea. São Paulo: Unesp/Ministério do Desenvolvimento Agrário, 2010. 567p.

Certa espécie animal vivia de caçar outros animais e de colher frutos e raízes. Há uns doze mil anos aprendeu que cultivar plantas e pastorear outras espécies possibilitava uma produção maior e mais estável. Não foi a primeira: certas espécies de formigas também cultivam e criam. Mas a agricultura da nova espécie os homo sapiens sapiens é a única a incorporar vagas de inovações tecnológicas, as quais se difundem, entram em crise e ocasionam o surgimento de outras.

O Ministério do Desenvolvimento Agrário teve de apoiar a tradução para o português do amplíssimo painel que os veteranos professores franceses Mazoyer e Roudart escreveram sobre a tradição agrária e pastoril da Humanidade. Compreensível o pouco interesse das editoras – trata-se de obra que se esmera pela precisão e por tentar não deixar pontas soltas. E esmera-se na precisão, às vezes à custa da leveza.

Os autores descrevem como a espécie agora agricultora deparou com um planeta coberto de florestas – e começou a derrubá-las. Do recuo da cobertura florestal surgiram os sistemas agriculturais diferenciados. Analisam em detalhe a agricultura do Egito, baseada no sistema hídrico possibilitado pelas cheias do Nilo. Também o plantio em patamares de montanha aperfeiçoado pelos incas e destruído pelos europeus.

A obra passa então a seu ponto forte, a análise da agricultura de zona temperada e sua evolução no último par de milênios. Detém-se na agricultura de tração leve praticada pelos romanos e pelos reinos que os sucederam no começo da Idade Média. Baseava-se ela também na permanência de uma boa fatia do terreno em descanso, o chamado alqueive. Os equipamentos utilizados eram poucos e simples.

Logo depois do ano 1000 completou-se na Europa um novo sistema que incluía uma utilização mais extensa do cavalo com uso de ferradura, puxando arados com mais peças de ferro, e com cultivos mais diversificados para recuperar as terras cansadas, o que exigiu mais forragem, serviços de ferraria e incorporação de novas espécies. Chamam a este novo sistema de tração pesada, que ocasionou o surgimento do capitalismo e que entrou em crise por volta do século XIV – a primeira crise agrícola.

E encontramo-nos novamente em crise. Para os autores esta tem origem nas sucessivas vagas de mecanização que engolfaram a agricultura desde o século XVIII, junto com o barateamento dos custos de transporte que possibilitaram a criação de um mercado mundial virtualmente único, ao menos para os cereais de base. O resultado dessa maior concorrência foi o esmagamento de grandes massas de agricultores em países de agricultura tecnologicamente mais atrasada. Para os autores, a solução da crise passa pela recuperação desses camponeses, com o estabelecimento de preços diferenciados para blocos de países com produtividades agrícolas semelhantes.

Trata-se de obra ampla, às vezes árida, mas cujo rigor contribui para esclarecer o leitor sobre a evolução da agricultura e seu papel na história do mundo.




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