segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Marcos, de Dag Hammarskjold

A Espiritualidade do Burocrata

HAMMARSKJÖLD, Dag. Marcos. Tradução de W. H. Auden. Prefácio de Jimmy Carter. Nova Iorque: Vintage Books, 2006. 222p.

A Vida de Simplicidade abre para nós um livro no qual nunca somos capazes de passar da primeira sílaba e do homem que escreveu isso dificilmente se pode afirmar que teve uma vida simples.

Dag Carl Hammarskjöld nasceu em 1905 cercado de privilégio, desde o pai, antigo primeiro-ministro da Suécia. Doutor em economia aos vinte e cinco anos, começou uma carreira de funcionário público profissional, desenvolvida principalmente dentro do banco central sueco. Depois da Segunda Guerra entrou na esfera internacional, representando seu país nos planos de reconstrução da Europa e como membro da delegação sueca junto às Nações Unidas.

Carreira esta que atingiu seu auge quando para sua surpresa o Conselho de Segurança da ONU recomendou seu nome para Secretário-Geral da organização. Foi eleito em 10 de abril de 1953.

O líder da ONU deveria navegar em um mundo partido em dois blocos liderados por potências nucleares e em geral o sueco conseguiu contornar bem os obstáculos. Que se tornaram ainda maiores quando as antigas colônias africanas entraram em processo de formar novos estados nacionais – nem sempre de maneira pacífica.

Entre os conflitos que pululavam o Secretário-Geral da ONU voava de um lugar a outro no continente africano, em busca de acordos de cessar-fogo. Em uma dessas viagens o Douglas DC-6B no qual viajava estatelou-se no chão na Zâmbia em 18 de setembro de 1961, deixando suspeitas de atentado que perduram até hoje.

Entre seus papéis encontraram uma carta a um amigo seu, outro funcionário público sueco. Dag deixava para o amigo as suas anotações pessoais. Este publicou-as e o resultado é o livro Marcos.
Hammarskjöld conheceu virtualmente todas as pessoas importantes de sua época, de presidentes a reis. Viveu na segurança e no conforto. No entanto seu diário não fala de política e se fala de sucesso é para se referir à sua falta de sentido. O livro trata das minhas negociações comigo mesmo – e com Deus.

Marcos não possui uma unidade – são pensamentos soltos, pequenos poemas, textos de dez ou quinze linhas que o autor acumulou desde a juventude. A temática lhe fornece a coerência. O homem que vivia em hotéis de luxo e banquetes e negociações de alto nível escrevia à noite algo como: Que Deus tenha tempo para você lhe parece tão certo quanto o fato de que você nunca tem tempo para Ele. Ou: Tudo no presente momento, nada para o presente momento. E nada para seu futuro conforto ou para o futuro de seu bom nome. Ou: Em muitas matérias a profunda seriedade só pode ser expressa em palavras leves e divertidas. Ou: não somos nós que buscamos o caminho – é o Caminho que nos busca.

Dag Hammarskjöld viveu a burocracia no que ele tem de mais tradicional – carreira, estabilidade, negociação. Os problemas que tentava resolver quase nunca o atingiriam pessoalmente. Mas empenhava-se em resolvê-los, pois era sua missão burocrática. E, para esse burocrata, a burocracia incluía também o espiritual.