segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

O Fogo e a Fúria, de Michael Wolff

WOLFF, Michael. The Fire and the Fury: inside the Trump White House. Edição Kindle, 2018. 321p.

Paulo Avelino

O fogo e fúria da Casa Branca caíram sobre este livro logo nos primeiros dias de 2018. Temendo que problemas legais pudessem impedir seu lançamento, a editora estadunidense antecipou-o para o dia 5 de janeiro, uma sexta-feira. Logo nas primeiras 48 horas o livro alcançou o topo.

Michael Wolff entrou o ano como virtualmente desconhecido. Terminou a sua primeira semana como celebridade mundial. Pelo que se vê na imprensa dos EUA, o jornalista nova-iorquino era mais conhecido como jornalista ligado à mídia e a celebridades, com um modo muito pessoal de escrever e ligado aos meios liberais, algo como um Truman Capote meio século depois e sem o mesmo charme.
Isso se reflete em seu livro. Segundo o próprio autor, o Fogo e a Fúria veio da possibilidade que a própria Administração Trump deu a ele – a de estar presente de forma costumeira na Casa Branca, a falar com uns e outros, registrando ou não as conversas, sem se tratar de entrevistas formais.

Trata-se portanto de livro de testemunhos e opiniões, de pessoas que lidam com Trump, sobre Trump e sobre si mesmos. Estilisticamente a obra segue os preceitos básicos do non-fiction estadunidense: a narração meio romanesca, a ênfase no suspense, a personalização dos fatos, no sentido de evitar grandes explicações econômicas e políticas. O resultado impacta.

O Fogo e a Fúria pode ser dividido em duas grandes partes. Na primeira Michael Wolff faz suas grandes revelações sobre Trump e sua equipe, razão pela qual as manchetes dos jornais sobre o livro se referiram basicamente a esta parte. O Presidente não queria ser eleito. Não gosta de ler. Não consegue concentrar-se por muito tempo em um assunto. Tem medo de morrer envenenado. E para um homem tão rico, tem preferências culinárias bem simplórias – gosta de cheeseburgers de fast-food.

A segunda parte desenvolve a primeira de uma forma cronológica nos primeiros meses da nova administração, a mostrar como a equipe e o presidente lidaram com cada crise – e elas foram muitas. Esta parte é mais árida, e exige mais conhecimento da política estadunidense.

A equipe de Trump tem criticado a obra. Tendo em vista o formato de livro de testemunhos quase sempre informais, não é de surpreender se parte dele se relevar impreciso. Ainda assim o Fogo e a Fúria assusta. De como pessoas tão medíocres, sem um plano definido, sem nenhuma grandeza política ou pessoal, sem nem mesmo muita cultura pudessem reunir tanto poder. A obra abala uma das crenças mais definidas que nós, que não temos poder, possuímos: a de que as pessoas que têm Poder o têm por alguma espécie de mérito. Muitos da equipe da Casa Branca lá estão apenas porque circulavam nos lugares certos com as pessoas certas, e mesmo essas pessoas certas só se tornaram assim porque por acaso venceram uma eleição que a maioria dava por perdida. Inclusive eles mesmos.

O Fogo e a Fúria tem suas limitações. Mas choca e revela – que é o que se propunha a fazer.